Página um: O Encontro

 


 A noite cai novamente e cá estou eu. Noites frias como essa sempre me chamam para uma caminhada pelo ar da noite. Eu não sei quando isso começou, mas já faz um tempo desde que comecei a andar por aí sempre que minha cabeça estivesse perdida em algum sentido. Sempre que me pego nesse estado, também paro pra me perguntar como isso acontece comigo. É como se sempre que algo deixasse de fazer sentido, outras coisas começassem a se encaixar de uma maneira muito assustadora, e quando menos espero, meus arredores mudam completamente. Os sons possuem uma nova frequência, as luzes projetam feixes em um diferente espectro e os problemas começam a se mostrar cada vez mais complexos, revelando toda sua estrutura que apesar de visível, ainda é, de alguma forma esquisita, indecifrável. Esse sentimento esquisito me desperta sensos inimaginaveis nos quais eu não consigo lidar. É como uma carga pesada, jogada até mim que transforma toda minha realidade e me deixa sobrecarregada. Bem, talvez no fundo isso seja só meus problemas se manifestando ou algum tipo de neuro divergência que gosta de brincar com a minha sanidade.
Quando me canso de andar, me sento finalmente. A lua continua linda, como sempre. Não me canso de olhar pra ela, sentada nessa mesma mureta, toda santa semana enquanto vejo as pessoas conversando sobre sei lá o que naquele bar. Me pergunto se algumas dessas pessoas também passam por esses momentos onde tudo se distorce. Acho que talvez isso seja algo comum entre os humanos, como se no fundo todos tivéssemos esses momentos onde a nossa compreensão se desloca e a mente se dá conta de como vivemos em um mundo pequeno e sempre fazemos as mesmas coisas, como um aviso de como tudo pode ser diferente num piscar de olhos.
Quando volto a prestar atenção nas pessoas, uma pessoa se destaca. Cabelos longos, camisa de banda e um jeans largo. Apesar de comum, algo nela me chamou a atenção, mas não sei dizer o que. Bem, talvez não seja nada demais. Olho pra baixo e só então minha ficha cai sobre o que aconteceu ontem. Era meu aniversário e aquele sentimento no qual venho falando caiu sobre mim no meio da confraternização. Me lembro de olhar para todos, como se tivessem o mesmo rosto. Minha visão e audição estavam completamente distorcidas e tentei ir até meu quarto. Dali em diante só lembro de estar sentada no chão pensando no que diabos estava acontecendo enquanto respirava pesado. Era como um pesadelo. No fim, lembro de alguém me encontrar, e então desmaiei. Tentando me lembrar agora, a voz parecia muito com a de Maira.
“Oi. Você tem isqueiro?”
Ouvi. Me assustei por um segundo e então voltei a realidade. Era a garota do bar.
“Desculpa, eu não tenho”, Respondi.
“Ah, tudo bem”, Disse ela meio desapontada. Olhando-a de perto, seus olhos eram cativantes. Seu rosto, mesmo que parecesse comum, tinha algo diferente. “Posso me sentar com você?”
“Claro”, Respondi. Ela então se sentou, respirou fundo e começamos a encarar aquele bar. Pensei então, como ela não encontrou alguém com isqueiro em um lugar tão cheio. “Você quer que eu pergunte se alguém ali tem um?”
“Não precisa. Isso tudo foi só uma desculpa pra sentar do seu lado. Algumas pessoas não gostam de fumantes por perto.”
“Meticulosa. Bem, você conseguiu”, Respondi. Ela sorri e então olha pra frente. “Não me importo que fume. Claro, caso você tenha um isqueiro.”
“Não tenho. Mas sei que em algum momento, ele vai aparecer”, Respondeu ela, olhando para o bar. Logo depois que ela terminou a frase, uma pessoa veio do bar em direção a seu carro. No caminho, ela saca um isqueiro e então a garota diz. “Ei! Você pode me emprestar o isqueiro?” A pessoa então assentiu e se redirecionou até nós. “Você quer um?” Me perguntou. Assenti. Ela me entregou um e então acendemos. Logo enquanto tentava acender, não aguentei e tossi. “Você é nova nisso, né?”
“É tão óbvio assim?”, Respondi. Ela então deu uma leve risada e voltou a olhar pro bar.

 “Sinto muito que eu seja sua péssima influência. Tudo tem um começo, afinal. Não é?” Disse ela. Assenti. “Não te julgo.”
“Bem, eu fiz 18 ontem, achei que devesse tentar”
“Acho que faria o mesmo em seu lugar”, Disse ela sorrindo. “Prazer, Khia.”
“Lana” Respondi levantando minha mão para cumprimentá-la. Ela apertou minha mão e olhou para o céu. Seu rosto continuava a me despertar curiosidade. Como ele poderia ser especial se parecia tão ‘normal’? “O que te fez vir até mim afinal?”
“Eu gostei de você”, Respondeu ela, olhando para o céu. Respirou fundo e então olhou em meus olhos. “Você parecia bonita, boa pinta. O que me chamou a atenção mesmo, foi que você parecia pensativa. Perdida, talvez.”
“É. Você acertou”, Respondi olhando para baixo. “Perdida. Como se a vida deixasse de fazer sentido, sabe?”
“Sim, eu sei bem”, Dizia ela, ainda com seus olhos em mim. Ela então tragou seu cigarro e fechou os olhos com seu rosto para cima. “Às vezes tudo o que a gente precisa é de uma pista. Uma luz que nos mostre onde é que devemos ir, o que devemos procurar. Talvez essa luz seja entender algo do passado, uma pessoa, um novo caminho.” Seus olhos se voltam para o chão e ela continua. “Ou até mesmo, uma resposta sobre algo que nem mesmo nós sabemos o que é. Algo que parece tão presente, mas ao mesmo tempo indecifrável”, Terminou, virando-se a mim novamente.
Seus olhos pareciam diferentes, profundos e misteriosos. Eu conseguia apenas olhar. Minha respiração muda e meu coração bate mais forte. Era como se eu estivesse apaixonada, mas sem nenhuma paixão. Eu me sentia presa, encantada.
“Acho que seu celular tá tocando”, Disse ela.
“Ah, sim!”, Respondi procurando por ele em minha bolsa.
Eu havia me perdido completamente naquele momento. Atendi e era minha mãe perguntando se estava tudo bem. Respondi a ela que sim e que só estava tomando um pouco de ar fresco.
“Ela parecia preocupada. Aconteceu alguma coisa?”, Perguntou Khia.
“Eu tive que ir pro hospital ontem, ela só tá perguntando se tá tudo certo e se eu tô bem”, Respondi. “Bem, eu acho que já vou indo. Não quero deixar ela preocupada.”
“Tudo bem. Também preciso voltar pra casa. Foi bom te conhecer, Lana. Espero que fique tudo bem e que se encontre”, Respondeu ela.
“Obrigada. Eu vou ficar bem”, Disse a ela enquanto sorria. “Eu também gostei muito de te conhecer. Eu posso te encontrar de novo? Se estiver tudo bem, claro.”
“Eu adoraria”, Respondeu ela. Ela pegou uma caneta de sua pochete e pediu minha mão para escrever seu número. “Te vejo por aí, Lana. Cuidado.”
Assenti, me despedi e então fui. Um encontro estranho, simples, mas que de alguma forma me trouxe alguma luz e muitas perguntas. Espero que eu a encontre novameeeeeeeeeennnnnnnnnnt____e_e___;;;;


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